Neste livreto, Gama Bell apresenta trovas temáticas. Embora cada trova seja completa em si mesma (como exige a forma), o conjunto de trovas também sugere uma narrativa própria.
Seus versos preferem a forma heptassilábica (em redondilha maior, também conhecida como "medida velha").
As poesias deste livreto estão registradas na Biblioteca Nacional:
Registro 579.036, Livro 1.106, Folha 111
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São bastante gracejados
Os amigos da polenta;
Normal... os pouco dotados
São os da classe ciumenta.
É bem verdadeiro o dito
"Quem desdenha quer comprar".
Quanto à polenta, repito:
Não desprezes sem provar.
Quanta piada jocosa
Pra cima do polenteiro!
Pensa: a polenta gostosa
A ninguém deixou esmoleiro.
Foram tidos atrasados
Os que comiam polenta;
Hoje, fina flor do Estado,
Das letras gente opulenta.
Levam no bolso um bodoque
E fazem glória cruenta;
Depois, sugestivo toque:
Passarinho com polenta.
Vejam a longa rotina
Sempre o mesmo, não se aguenta;
É, na verdade, abomina:
Não muda, é sempre polenta.
É folclórica a rotina
Que um povo alegre sustenta;
Força e trabalho combinam
Com queijo, vinho e polenta.
Inúteis tantas querelas
Motivadas na polenta;
Provem, constatem sequelas,
Não sabem como alimenta!
Se tanta gente critica
O comer tanta polenta,
Deixa, porém verifica
O povo forte que ostenta.
Venham todos, grande festa
Deixará recordações.
E a gente fina se apresta
E... polenta e decepções!
Por que tanto cuidado
Com os que comem polenta?
O tempo já tem provado
Que com pouco se contentam.
Polenta... finas chacotas...
Não ligam, comem faceiros;
Na verdade, sempre lorotas
Feitiço contra feiticeiro...
Está em todo o calendário
A polenta para a pança
É verdadeiro ideário
Porque é preciso poupança.
Os que dizem que é grossura
Polenta sempre comer
É que sentem a tortura
Da fome recrudecer...
Quanta agressão à polenta
Com muito e sutil humor!
Porém a mesma sustenta
O seu próprio promotor...
Quantos procuram na orgia
O que o silêncio não traz
Lata quanto mais vazia
Tanto mais barulho faz.
Idade Média tachada
De silêncio milenar
Obra-prima assinalada
No afanoso perscrutar.
Se o silêncio te incomoda
É que algo não está bem
Anda, inquire à pressa toda
Verás o preço que tem.
O que dizer das querelas?
Nada, a nada conduziram
Também as tantas sequelas
Que no silêncio sumiram...
Como a mãe a filho embala
Para fazê-lo sonhar
O silêncio muito fala
A quem o sabe escutar.
O silêncio tem matizes
Consente, alegra, perdoa
Faz a muitos infelizes
A outros castiga, atordoa.
Muito pouca gente atura
O vil cão que muito ladra
Muito o silêncio censura
Sim, muito mais que a palavra.
À medida que mai cala,
Se enovela docemente
O silêncio bem mais fala
Sério lá dentro da gente.
O silêncio é voz que passa
É, passa e não volta mais
Gratos momentos de graça
Não, não esqueças jamais.
Sim, repito com franqueza
O pensamento profundo:
Com o silêncio, riqueza
Sem ele, atraso rotundo.
Quantos silêncios marcantes!
Nem é preciso citar
Mas o mais desconcertante
É, na ofensa, de ombros dar.
Maior silêncio não houve
Que o de Cristo em sacra via:
Remir, o destino aprouve
Mostrar ante a tirania.
Silêncio que mais me encanta
É o da criança a dormir
Serenidade, paz quanta
No futuro perseguir!
O silêncio, certamente
A muitos recompensou
Mas castigou duramente
A quem sempre o relegou.
Silêncio não significa
Faltar à sinceridade
Ele ele a vida tonifica
Não ludibria a verdade.
Gesticula e vocifera
Explode ira, malquerença
Para esta aparente guerra
Silêncio da indiferença.